Fado renasce através de Bruno Belthoise e Ana Barros




A Ana Barros e o Bruno Belthoise juntaram-se recentemente neste novo e belíssimo projecto - SEVERA, o Fado de um Fado. Como se conheceram?

Ana: Em 2012, pisamos juntos o palco do Teatro Ribeiro da Conceição em Lamego, pela primeira vez, para uma série de concertos. Nessa altura apresentávamos o conceito dos concertos narrados que o Bruno Belthoise criara em França e que apresentou depois no Conservatório do Porto. 
Bruno: A Ana Barros foi convidada para participar no projeto para fazer a narração da História de Babar e de Carnaval dos Animais. Naturalmente que os intercâmbios musicais e as conversas sobre o nosso interesse comum pela música portuguesa permitiu identificar ideias similares. O desejo de explorar novos caminhos à volta do fado era forte. 

Ambos com formação e carreira fortemente ligada à musica erudita, como e a que se deve esta aproximação com o Fado?

Ana: O fado existe na minha vida desde que me lembro de existir. A minha mãe, também ela cantora, empre o cantou muito lá por casa. Desde cedo que o canto também. Embora tenha estado sempre presente na minha vida, e que ao longo destes anos tenha sido convidada a participar em alguns projectos, nunca consegui ter um projecto meu. Sempre tive vontade de criar um projecto de fado que estivesse fora do tradicional, onde pudesse precisamente mostrar as minhas influências, que pela minha formação e carreira estão directamente ligadas à música erudita. E com esta Severa – o fado de um fado, consegui.
Bruno: Ao estudar as obras de música portuguesa para piano descobertas em Lisboa, senti intuitivamente que o meu piano, um dia, viria a substituir a tradição e mergulhar de uma forma moderna, mesmo insolente, no mundo do fado. Não é trivial sacudir os hábitos, largando nos meandros de uma memória colectiva de traços também impregnados de intensidade do vermelho escuro do Fado Português e do fraseado único da guitarra portuguesa... Hoje, esta aventura musical emocionante toma o caminho de uma re-criação, a de uma nova cor para viver fado, uma aventura relacionada com a voz do amor de um povo, a força e a fragilidade simbólica de Maria Severa.

Quem foi Severa?

A Severa é uma figura que vive no imaginário de todos os portugueses, já que é a primeira fadista conhecida da história do fado.
Teve uma vida ligada à prostituição. Cantava na rua para angariar os seus clientes e privava diretamente com os marinheiros e os vendedores do mercado. Teve vários amantes, entre eles o Conde de Vimioso que introduziu o fado nos salões, e a convidava a participar nos seus saraus.
Morreu muito jovem (aos 26 anos) de tuberculose, a 30 de Novembro de 1846, num miserável bordel na rua do Capelão, na Mouraria, em Lisboa.

Porquê a Severa?

Pelo mito, pelo facto da maioria dos fados estarem pejados de factos relacionados com a sua vida, e porque ao pensarmos em revisitar o fado, achámos que seria interessante começar na origem. 
Não se conhecem registos de fado antes dos inícios do séc. XIX, ou seja o fado e a Severa nasceram pela mesma altura.


Foi difícil entrar neste novo mundo/linguagem?

Ana: Não foi difícil, ambos amamos o fado. Eu, como já disse, tenho um passado ligado ao fado, através da minha mãe. O Bruno, depois de alguns (poucos) ensaios começou a perceber a linguagem e daí para a frente foi tudo muito rápido. Penso que os arranjos dos compositores - Carlos Azevedo, Sérgio Azevedo e Carlos Marecos -, que trabalharam connosco, também nos facilitaram o processo, já que todos têm uma ligação com o fado, e todos perceberam o que pretendíamos com o projecto.

Este projecto conta com a colaboração de várias personalidades? Quem e em que papéis?

Sim, na realidade contamos com o apoio de muitas personalidades/instituições. 
A primeira instituição que procurámos foi o Museu do Fado, do qual recebemos de imediato um apoio total. De quem recebemos igualmente a maior chancela de qualidade possível, ao permitir-nos a utilização do logótipo “Fado – Património da Humanidade” no nosso disco. Contamos com a colaboração do Prof Dr Rui Vieira Nery, que nos apresentou algum repertório que não conhecíamos. O Museu do Fado pôs no nosso caminho o fadista João Braga, tutor precioso no rigor musical e textual. O João apresentou-nos o Miguel Amaral, outra pérola deste disco, que com a sua guitarra portuguesa e disponibilidade musical trouxe ao projecto um toque de tradição e “transfiguração” com irreverência. O Instituto Camões para a difusão internacional do nosso projecto; a Antena 2 que nos apoiou na gravação; e o mpmp que lança o nosso disco.



Como escolheram os fados para a gravação?

Bem, nós sabíamos logo à partida que iríamos incluir determinados fados que têm textos directamente ligados à vida da Severa. Outros teriam que estabelecer a ponte cronológica com a história do fado. Temos fados retirados do Cancioneiro de César das Neves, fados esses, que têm textos que de alguma forma poderiam ilustrar a vida da Severa e outros mais recentes que fazem parte da história deste género musical.
 

Este projecto encontra-se entre os vários a serem apoiados via crowdfunding. Como e onde pode ser ajudado?

As pessoas que quiserem apoiar o financiamento do CD SEVERA – o fado de um fado, podem fazê-lo através do site PPL (http://ppl.com.pt/pt/prj/severa), uma plataforma de financiamento coletivo. 




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